Carolina C.

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Sou influenciada a escrever por tudo o que ouço,toco,vejo,sinto e leio. E por lembranças também, portanto a autoria é das projeções do meu mundo.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Própria Cura

-Seu problema é grave.
-Como assim, grave?
-Do tipo que tem cura.
-Não entendo.
-Essa cura é dolorosa, é um processo que vai ser difícil a senhora resistir. Você terá vontade de acabar com tudo, fugir da cura. Para que sua vida não se finde, você terá que passar intacta pela cura, claro, você poderá recair, mas só em último caso.
Saí da sala de cirurgia confusa, o médico não tinha dito nada que me parecesse sensato, apenas sobre a cura, a minha cura. Disse que só eu poderia criar minha cura, e passar por ela da minha maneira, ou seja, eu teria que me diagnosticar. Sabendo da minha nova missão, comecei a pensar sobre minha cura. Sentada no banco novinho de meu carro, passei meu tempo a refletir sobre minha vida, fiz um playblack da infância, família, casa, pessoas que conheci...
-Meu passado deve me ajudar de alguma forma.
Olhei o retrovisor e vi os olhos de sempre, castanhos (nunca gostei da cor de meus olhos, quis que fossem verdes) e fundos; vi os olhos que viram tudo o que me lembro, quadros, rostos, lojas. Rostos...o plural nunca se aplicou a mim, desde criança sempre fui muito egoísta: "O chocolate é meu", "eu quero isso, compre!", "não gosto mais de você, não te amo". Egoísmo de nascença, defeito que nunca morreu dentro de mim depois de todos os obstáculos que vivenciei por causa dele, lutei muito, mas é um mal meu, um mal necessário até. Voltando ao presente, lembrei da minha cura.
-Não sei o que pensar mãe.
-Filha, pense no que mais gosta de fazer, isso talvez ajude.
-Obrigada mãe.
A ligação foi rápida mas prestei atenção nas palavras de minha mãe. Eu gosto de viajar, comer, assistir a filmes e conhecer gente... Bem, esqueça o gente. Sim, vou viajar, ainda não conheci a Rússia, ou a Grécia, adoro mitos, mas agora lembrei que não tenho dinheiro. Então vou comer e assistir TV o dia inteiro, todos os dias...não, melhor não, vou engordar e esquecer do mundo. Sobrou o conhecer gente nova...Mas eu não preciso conhecer gente nova, pessoas ferem meu coração; meus amigos foram embora, meus ex-namorados estão casados, que fazer com essa gente?
-Nada.
Começou a chover e os vidros de meu carro formaram bolinhas de água, escorrendo horizontalmente por causa de minha velocidade. Ao meu lado as árvores eram apenas quadros abstratos, não tinham forma, em minha frente as luzes se apagavam, já era tarde e a eletricidade das casas e prédios descansavam, apenas alguns carros, como o meu, iluminavam a estrada.
Dirigindo sem rumo, esqueci-me da vida (mesmo que estivesse vivendo), da cura e de tudo o que eu olhava. Meus olhos começaram e fechar e de repente meu corpo foi levemente lançado para frente, meus braços quase nas costas e meu rosto cheio de fios de cabelo. Uma luz vermelha cegou-me por completo e vi-me dentro de uma sala de hospital.
-Eu te avisei, Linda.
O médico fechou meus olhos e tudo escureceu.
-Devia ter me curado.

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