Carolina C.

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Sou influenciada a escrever por tudo o que ouço,toco,vejo,sinto e leio. E por lembranças também, portanto a autoria é das projeções do meu mundo.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

O Jardim do Seu Mário

Sim, não era amor, mas uma paixão incontestável. Aquele fatídico encontro em meio às roseiras do Seu Mário parecia ter sido propositado, como nos filmes de ficção amorosa. Sim, ficção porque nada daquilo que se passa naqueles rolos de filme transmitem a verdadeira sensação de estar ao lado de quem se ama, além das ilusões mágicas que são ensinadas em cada beijo inusitado, ou em cada flor dada. Mas claro, foi amor para aquele ingênuo e submisso menino, que não desejava encontrar alguém para casar e, quando menos esperava, acha-o ali, em meios aos vermelhos ardentes de rosas a lhe chamar.
A menina, de pele alva como o leite, mas sangue negro como a noite, tinha aparência de princesa para todos, mas guardava dentro de si um nojo por quem lhe dirigia a palavra. Enquanto fazia um de seus passeios solitários, um de seus maiores divertimentos, decide pelo jardim de Seu tio Mário entrar e, de repente, levanta os olhos das flores e vê-se frente a um menino estranho e fraco. Sorri depois de um momento de avaliação, e pergunta o seu nome - Meu nome é Bento. Qual é o seu? - Marília. Os preconceitos das duas crianças foram tomando forma. Bento achava-a esnobe por seu vestido de cetim, e desleixada por seus cabelos ruivos numa trança cheia de espinhos. Marília sentiu o mesmo nojo que sentia pelos outros, e ainda declarou o menino um afeminado. - Estás a passear? perguntou o menino - Sim, decidi visitar meu querido tio, dono deste jardim. Há tempos que não o vejo. E você, o que fazes aqui? sentiu uma ponta de repulsa da menina, e por um momento pensou em correr dali, mas se recompôs e respondeu - Também passeio. Cheguei a esta cidade há duas semanas, meus pais pediram-me para que eu visita-se os arredores, e eu estou cá. - Hum!. O olhar da menina foi de desinteresse. O do menino de tédio. Após dois minutos de silêncio, Bento disse - Já está perto do meio dia. Preciso ir para casa almoçar. Até um dia, Marília. E saiu correndo dali como que fugisse de uma cobra no meio do mato. A menina respirou aliviada, agora sim podia continuar seu passeio em paz.

- Mamãe, mamãe... - O que é menino? - Já está pronto o almoço? Já sentado à mesa da sala de jantar, D. Marta serve o prato de sopa fervente, a colher e o suco - Sopa, de novo mãe? - Do que reclamas guri? Agradeça ter comida hoje, seu pai ainda não conseguiu emprego. Bento olhou para a comida, e começou a bebê-la.

Meia hora depois, Marília voltou para casa e foi ter na cozinha com a governanta Judi - Que tem para comer hoje, empregada? - Peru e farofa - Ótimo! disse num tom autoritário a menina de várias posses. Sentou no sofá da sala e ficou esperando o seu prato chegar. Enquanto isso, lembrou-se da mãe que morrera naquela mesma sala, e do pai, que vivia no trabalho - Aqui está, Mariliazinha! e apagando seus devaneios, irritada gritou com a mulher, que saiu dali imediatamente.

O sol do dia seguinte despontou. As duas crianças acordaram cedo, e como era sábado aproveitaram o dia para brincar. E por grande coincidência, os dois foram ao jardim do Seu Mário. Primeiro chegou Bento. Ao vê-lo ali novamente, Marília não pôde conter um suspiro de decepção, mas como uma boa menina recebeu-o como no dia anterior. Após as saudações, cada um foi pra o seu lado, de modo que as rosas vermelhas acompanharam Bento, e as ervas daninhas a menina.

Passado o tempo, as crianças já não aguentavam mais o tédio de estar ali sem poder fazer o que queriam por causa do outro. Então, como se todos os preconceitos fossem embora, Bento saiu de seu lugar e chamou por Marília, que espantada, segurou a mão do menino e andou pelo jardim ao encontro das rosas. Conversaram durante muito tempo, observaram as abelhas em cima das flores, arrancaram os matinhos lisos da terra, brincaram de quase tudo que sabiam, e no final da tarde, deitaram-se em cima das folhas de uma laranjeira ali perto. E ficaram conversando mais ainda. Aquele dia juntos mudou muito a vida das duas belas crianças daquela vila. Um conheceu a história do outro, seus medos, paixões, aspirações e alegrias. Os preconceitos de antes voaram como pelo, e agora reinava amizade.

continue

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